terça-feira, 8 de março de 2011

EDUCAÇÃO INTEGRAL:

EDUCAÇÃO INTEGRAL:
Um projeto político-pedagógico ou político-eleitoreiro

Por Ednéia Angélica Gomes




De acordo com o documento EDUCAÇÃO INTEGRAL: Elementos para o debate do MEC (2008), a Educação Integral tem como pressuposto a doutrina de Proteção Integral que fundamenta a proteção devida à criança e ao adolescente prevista na Constituição Federal (1988) e no Estatuto da Criança e do Adolescente (1990).
Do ponto de vista legal, a Educação Integral é incentivada com recursos do FUNDEB (Lei 11.494/2007) e está prevista na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/96)Art. 34. A jornada escolar no ensino fundamental incluirá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na escola”. Além disso, a LDB admite e valoriza as experiências extraescolares (Art. 3º, inciso X), as quais podem ser desenvolvidas com instituições parceiras da escola. Também a Constituição Federal é utilizada como amparo legal para a implementação da Educação Integral, o Art. 205 determina que “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade”.
Por sua vez, a Lei nº 10.172, de 2001 que instituiu o Plano Nacional de Educação valoriza a educação integral e apresenta a educação em tempo integral como objetivo do Ensino Fundamental e, também, da Educação Infantil. A meta do PNE é a ampliação progressiva da jornada escolar para um período de, pelo menos, 7 horas diárias, além de promover a participação das comunidades na gestão das escolas incentivando a instituição de Conselhos Escolares.
A Educação Integral é vista como um projeto de educação humanizadora que se propõe a romper com a dicotomia escola/vida social. Tem como perspectiva o ideal de Cidade Educadora que compreende a cidade como uma grande rede de espaços educativos formais e não formais. Supõe uma articulação entre escola e sociedade, e se referencia em Anísio Teixeira, citando o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, que já em 1932 propunha:
“(...) haverá escolas nucleares e parques escolares, sendo obrigada a criança a freqüentar regularmente as duas instalações. O sistema escolar para isso funcionará em dois turnos, para cada criança (...) no primeiro turno a criança receberá, em prédio econômico e adequado, o ensino propriamente dito; no segundo receberá, em um parque-escola aparelhado e desenvolvido, a sua educação propriamente social, a educação física, a educação musical, a educação sanitária, a assistência alimentar e o uso da leitura em bibliotecas infantis e juvenis” (Teixeira, 1997, p. 243)
Na contemporaneidade, a ideia dos parques escolares é substituída pelos espaços do entorno da escola, articulando educação formal e não-formal, Estado e Organizações da Sociedade com vistas a atribuir um novo significado às experiências e conhecimentos escolares. A escola é o centro do processo, mas não deve atuar sozinha, ao contrário, deve romper o isolamento e promover a articulação entre todas as instâncias potencialmente educativas. A educação torna-se, assim, uma responsabilidade coletiva: Família, Estado e Comunidade são convocados a somar esforços para que os estudantes sejam educados integralmente.
Para isso, o projeto reconhece as políticas públicas de esporte, de educação ambiental, de inclusão digital, de educação profissional, de educação em saúde, de Juventude, entre outras como parceiras da educação escolar na construção de uma proposta única. Além disso, valoriza os atores locais reconhecendo-os como protagonistas do processo educativo local, com apoio do poder público.
Tal proposta encerra o grande desafio de construção de um projeto comum que rompa com ações paralelas muitas vezes antagônicas. Para isso é preciso que a cooperação, o diálogo, o trabalho coletivo e a solidariedade substituam o individualismo e a competitividade da lógica social que predomina.
Em algumas escolas de Belo Horizonte, o projeto já está acontecendo. A jornada educativa foi ampliada para nove horas: são quatro horas e vinte minutos de aulas regulares ministradas pelos professores da Prefeitura e as demais horas complementadas com atividades de diferentes áreas do conhecimento, formação social e pessoal, lazer, esportes, cultura e artes, acompanhamento pedagógico, desenvolvidas em oficinas. As oficinas e cursos são ministrados por estudantes de curso superior e pessoas da própria comunidade em espaços próximos da escola. Entretanto, ainda é muito cedo para uma avaliação de resultados do projeto.
Em 2009 foi instituído o Programa Mais Educação que se empenhou na construção de parcerias intersetoriais e intergovernamentais. Através do Documento da Série Mais Educação Educação Integral TEXTO REFERÊNCIA PARA O DEBATE NACIONAL, o MEC convida estudantes, trabalhadores da educação, pais, mães, gestores – e demais profissionais e instituições a colaborarem com a construção do Projeto de Educação Integral, envolvendo-se no diálogo nacional sobre o tema.
Nesse documento, o MEC justifica a Educação Integral no contexto brasileiro contemporâneo como uma estratégia política de superação das desigualdades sociais. Cita a discrepância entre os resultados do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) que, em 2006, variou de 0,7 a 8,5 entre escolas. E, sem desprezar a contribuição da situação de vulnerabilidade e risco social no baixo rendimento escolar das crianças pobres, ressalta que as desigualdades também têm suas bases na qualidade dos sistemas públicos de ensino.
“No país, a crescente expansão da oferta de vagas na escola pública não foi acompanhada das condições necessárias para garantir a qualidade da educação. Coexistem, até hoje, problemas como degradação do espaço físico, aumento de turnos e de número de alunos por turma, descontinuidade das políticas públicas e a disseminação de múltiplas tendências pedagógicas sem a preocupação com sua sustentabilidade teórico-metodológica vinculada à formação inicial e continuada de professores.”(2009)
Ainda segundo o documento do MEC, a educação de qualidade é indispensável para que todos tenham assegurado o seu direito à cidadania. Assim, é necessário que todas as crianças tenham acesso à escola, mas mais do que isso, que nela permaneçam aprendendo e desenvolvendo-se de forma integral.
Dessa forma, as funções sociais da escola se ampliam: além de educar ela agora também protege. Essa discussão gera polêmica entre os defensores da especificidade da educação escolar e aqueles que acreditam que não há como a escola ensinar conteúdos sem se envolver com os problemas da comunidade na qual está inserida. No meio desse processo, o MEC reconhece a importância do envolvimento dos professores no projeto e pretende obter a adesão dos profissionais através de ‘melhorias’ na formação inicial e continuada.
Um outro ponto de tensão diz respeito à eficácia de uma jornada estendida no aproveitamento dos alunos. Muitos argumentam que mais tempo de escola não garante por si só a eficiência do processo de ensino e aprendizagem. Entretanto, o MEC responde a essa crítica dizendo que a Educação Integral não é apenas uma ampliação de jornada escolar, mas uma possibilidade de ressignificar os tempos e os espaços escolares, através da participação dos alunos em projetos sócio culturais e educativos que valorizem a comunidade a que pertencem. Dessa forma, a ideia é tornar a escola um lugar mais atrativo buscando constituir uma verdadeira educação cidadã.
Em relação aos processos de ensino e aprendizagem da Educação Integral, o MEC propõe que a organização seriada seja revista, com o objetivo de diminuir a repetência e evasão. Aposta numa articulação entre o Projeto Político Pedagógico das escolas e as comunidades nas quais estão inseridas. E, por fim, recomenda que os currículos levem em consideração a articulação entre a Política da Educação Integral e as avaliações de massa. Ou seja, lembra que os currículos devem contemplar, com prioridade, as capacidades de leitura e resolução de problemas matemáticos avaliadas pela PROVA BRASIL.
Em minha opinião, a Educação Integral pode funcionar de maneira satisfatória em comunidades que tenham uma boa relação com a escola e onde já exista uma mobilização em torno de projetos culturais e esportivos. Entretanto, as comunidades são muito diferentes e, na maioria delas, o projeto não terá como contar com o apoio da população, o que acarretará para a escola pública uma responsabilidade a mais, além das muitas que já tem. A articulação com a comunidade sempre foi difícil para a maioria das escolas, principalmente aquelas situadas em bairros onde existe muita violência. Sem falar que, grande parte dos professores (desvalorizados e mal-remunerados) não estão dispostos a se envolver em propostas como essa.
Além disso, ainda que o MEC faça um grande esforço para justificar o projeto salientando as suas possibilidades pedagógicas, continuo vendo nessa proposta um interesse eleitoreiro, uma vez que os recursos disponibilizados são insuficientes para que o projeto funcione da forma como está idealizado. Ainda assim, a maioria dos pais, em especial os das comunidades carentes, vê a proposta com bons olhos uma vez que ela representa, na pior das hipóteses a possibilidade que eles podem vir a ter de trabalhar em paz, com os filhos fora dos perigos da rua.

Referências bibliográficas
BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nº 9.394. Brasília, DF, 1996.
BRASIL. Educação Integral: texto referência para o debate nacional. Brasília: MEC. SECAD, 2009.
BRASIL. Rede de saberes mais educação: pressupostos para projetos pedagógicos de educação integral. Brasília, Ministério da Educação, 2009.
BRASIL. Lei no. 8069. Estatuto da Criança e do Adolescente 1990.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil 1988.



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